Deixamos a Paraíba e entramos no Pernambuco, o décimo segundo estado que estamos passando. A primeira parada foi na Ilha de Ilha de Itamaracá, sem grandes belezas ou atrações, mais para moradores mesmo.
Chegamos em Recife passando pelas belas pontes sobre o Rio Capibaribe que corta a cidade com vários braços. Recife lembra um pouco Veneza ou Amsterdam. Passamos pelo centro histórico e fomos até uma praça com alguns motorhomes acampados. A localização é ótima, mas não tem água ou eletricidade. Alguns viajantes estão praticamente morando no local e oferecem ajuda se você quiser ficar. Não ficamos. Fomos embora, mas antes paramos na Praia de Boa Viagem, preparamos e almoçamos de frente para a praia mais famosa de Recife.
No mesmo dia seguimos para Porto de Galinhas, onde também não tem camping e os motorhomes ficam estacionados na Praça Quatro. Na Praça Dez também era possível estacionar até pouco tempo mas, com o grande fluxo, alguns relaxos e abusos de campistas, somando aos ciúmes de alguns incomodados donos de pousadas, a prefeitura proibiu pernoitar na Praça Dez. Na Quatro ainda é possível. Os cuidadores prepararam ali um espaço para motorhomes e ainda oferecem, água, eletricidade, wifi e sombra, num lugar reservado. Eles fazem parcerias com os vizinhos para conseguir água e energia e cobram uma taxa de permanência de 20 reais por dia.
Na Praça Quatro quando chegamos já haviam mais dois motorhomes. A praça não é urbanizada e serve de estacionamento para os hóspedes das pousadas e trabalhadores da cidade que deixam ali seus carros e carrinhos/bar. A localização é excelente, bem próximo das praias e dos principais pontos comerciais.
A praia aqui neste pedaço do Brasil é das melhores, eleita por 10 vezes como a melhor praia do Brasil . Com temperatura agradável, de um azul ou verde turquesa, não sei, além da formação de piscinas naturais como em poucas praias. Realmente um encanto que merece a fama que tem.
Até procuramos uma pousada ou estacionamento que pudesse nos abrigar, mas como tem feriado prolongado nesta semana, não se interessam em alugar o quintal. Tudo bem. Vamos dormir na praça mesmo.
A noite a atração é passear pelas centenas de lojas com os mais diversos artigos de vestimentas e lembrancinhas e, claro, a galinha comanda o visual.
Tem galinha para todo lado. Galinhas feitas com pedras preciosas e galinhas esculpidas rusticamente em troncos da árvore do coco.
A fama da galinha começou ainda nos anos de 1.500, logo no início da exploração europeia no novo continente. Com a necessidade de mão de obra para explorar cada vez mais, traficavam escravos da África para a América e os que chegavam aqui nesta região eram trazidos de forma desumana. Ficavam presos e escondidos entre engradados de galinhas d’angola. Quando eles chegavam os traficantes anunciavam pela senha “Tem galinha nova no Porto”. Foram tantas repetições feitas pelo tráfico que acabou virando nome do local, Porto de Galinhas, que um dia já se chamou Porto Rico, devido à grande quantidade de pau brasil que era extraído na região. Pela barbarie que a história conta, acho que este paraíso não deveria carregar está triste lembrança no nome, nada contra a galinha.
Entramos numa loja atraídos pelo colorido das roupas e obras de arte, produzidos pelo artista plástico Beto Kelner. Ele estava presente na loja, contou sua história e até pousou para uma foto com Ade.
Sua coleção abrange dois segmentos: casa e moda, com artigos de decoração, roupas e acessórios. O sonho do Beto e colorir o mundo com seus artigos feitos com materiais recicláveis descartados. Com parte do lucro do seu trabalho ele sustenta uma ONG voltada para a sustentabilidade do planeta, além de lojas com vendedores vestidos com as roupas do artista e muito atenciosos.
Restaurantes tem pra todo gosto, bem decorados, a maioria com cardápio de comidas típicas e música ao vivo. Paramos para comer um petisco e tomar uma caipira ao som do forró pé de serra, servido por cangaçeiros. Até pousei de lampião para uma foto tirada pela Maria Bonita, também conhecida atualmente como Ade.
Na Praça Quatro também está acampado um casal de jovens que viajam de kombi divulgando moedas eletrônicas e vendendo palha italiana, um doce com chocolate e bolacha, fonte de renda deles pra custear a viagem. Tem dias que vendem até 100 palhas italianas, feitas por eles mesmos dentro da kombi. As palhas são vendidas na praia por 12 reais cada uma. O custo unitário fica em torno de 2 reais. Nem sempre vendem 100 por dia, mas sempre vendem.
Os dois jovens se complementam no gosto por viagem e no empreendedorismo. Ela é o financeiro e ele o vendedor. Os dois fabricam, embalam e entregam seu produto direto ao consumidor, tete-a-tete. Padronizaram o tamanho, a embalagem e a forma da abordagem. Convencem o comprador quando contam que viajam de kombi , divulgando as novidades do dinheiro eletrônico e a venda de doces é para sustentar a viagem e aí começa uma conversa em torno do doce, das cripto moedas e quase sempre conseguem vender, pelo menos um. Eu mesmo comprei um e digo que a palha italiana dos meninos de Londrina é muito gostosa e altamente rentável.
Claro que somente a qualidade do doce e forma de abordagem não é suficiente. É imprescindível o esforço e dedicação para alavancar e manter o negócio.
Mas, o que tem haver moeda virtual e palha italiana? Nada. A não ser a vontade nata dos dois jovens de Londrina em realizar seus próprios sonhos de forma sustentável. Simples assim.
A noite novamente passear pelas lojas e observar pessoas passeando, poucos com sacolas nas mãos, mais todos olhando e se olhando enquanto vagueiam entre paradas para selfies, lojas e comidas. Está é uma semana de feriado prolongado no Brasil e a pequena Porto de Galinhas com 4 mil habitantes, tem que suportar dezenas de milhares de pessoas, incluindo nós. Assim segue a nem sempre fácil interação entre turista e morador, ou locais como os turistas costumam chamar os moradores .
Ter ou não ter turistas, eis a questão.
Na Praia central ficam dezenas de jangadas que levam turistas até os corais, que ficam aparentes com a maré baixa. É um passeio curto que só pode ser feito quando a maré está baixa. Quem não quer pagar o passeio de jangada, podem ir a pé e forma uma fila indiana, apelidado de caminho de Moisés. Vão para ver os peixes coloridos que frequentam as piscinas no meio dos corais. Os peixes sempre ficam ali à espera dos alimentos que os guias distribuem para os turistas alimentá-los. Peixes e guias são parceiros para encantar os turistas. O guia ganha com o aluguel da jangada, o peixe ganha comida e o turista ganha com o encanto. Todos ganham.
Quem não quiser ir da jangada e nem a pé até os corais, pode também observar e até brincar com os peixinhos coloridos que ficam presos nos buracos cheios de água, ali mesmo na praia. Dá para se sentir dentro de um aquário.
Fomos para nossa caminhada longa de 12,5 km, ida e volta. Fomos pela praia até a Ponta do Maracaipe, onde deságua um rio que se mistura com o mar quando a maré sobe. Se a maré estiver baixa tem o espetáculo dos braços de rio, formação de piscinas naturais e bancos de areia. Um pouco antes da maré subir é preciso sair dos bancos de areia para não correr o risco de ficar preso pelas águas e ter que nadar para voltar. Os guias e garçons que servem no local avisam para que todos saiam um pouco antes do nível das águas subir.
Na volta paramos para tomar água de coco e caldinho de sururu, uma delicia, vendo o mar ciscar por debaixo das construções que invadiram seu espaço.
Enquanto o mar tenta retomar seu espaço, o vento disputa braço forte com as árvores. O coqueiro suporta, mas outras mais frágeis se rende ao poder dos fortes sopros que vem do oceano.
Aproveitamos para fazer a caminhada calculando o tempo para assistir o eclipse da passagem da lua bem em frente ao sol, um lindo espetáculo da natureza.
Coloquei meus óculos de sol em frente a câmera do celular e, contanto com ajuda de umas poucas nuvens, consegui fazer está foto da lua adentrando o soberano sol, fazendo sombra na Terra.
A noite pegamos nossas cadeiras, convidamos nossa vizinha e fomos sentar na rua das sombrinhas, onde as pessoas se enchem de poses para ficar bonita, pelo menos até o clic final da foto.
A nossa vizinha merece um destaque pela coragem que tem em estar realizando seus sonhos. Ela tem uma van motorhome e viaja sozinha. Ela nos contou muitas histórias de como é viajar sozinha, sem medo, com vontade de fazer o que gosta, viajar mesmo que solitária. Solitária mas sempre fazendo amigos e vivenciando novas culturas. Ninguém pode se negar a realizar seus sonhos, não importa que as condições não sejam comuns, o importante é realizar.
A noite a praia fica ainda mais bonita com dezenas de jangadas colorindo o oceano com fundo escuro.
A pequena vila tem vários pontos para alegrar os amantes de selfies. Tem portais, jangadas coloridas, galinhas gigantes, estátuas de Lampião, Maria Bonita e Luiz Gonzaga. A rua das sombrinhas é um dos principais atrativos para fotos com celulares e tem também os fotógrafos que fazem fotos, você paga e ele te encaminha na hora pelo wattsap.
Mais uma noite de sono tranquilo e partimos para um novo paraíso, Maragogi, agora entrando no Estado de Alagoas.