Ainda com nossa morada em Verona, viajamos para visitar Bolonha, a cidade cheia de apelidos.
Bolonha é conhecida por sua culinária, por isso o primeiro apelido “La Grassa”, ou a Gorda. O prato chefe da culinária bolonhesa é o tagliatelle à bolonhesa, massa um pouco mais grossa e larga que o espaguete.
Come-se muito na cidade gorda. Os bares pela cidade costumam colocar uma mesa com diversos quitutes regionais. Basta comprar uma bebida para ter acesso à mesa de comidas.
No nosso caso a experiência culinária com o prato típico, não foi das melhores. Escolhemos um restaurante no quadrilátero central, onde ficam os melhores restaurantes. Escolhemos um com tradição desde 1912, mas a comida não era assim das melhores, o preço sim. Tudo bem, provamos a comida da gorda, talvez no restaurante errado ou em um dia ruim dos cozinheiros.
O segundo apelido é “La Dotta”, devido ao fato de ser uma cidade universitária e entenderem que é uma cidade muito culta. Sem desmerecer o apelido, penso que uma cidade com gente culta não acumula lixo nas ruas, o trânsito é de respeito e as edificações históricas são conservadas. Não foi bem o que vimos.
O terceiro apelido é “La Rossa”, ou a vermelha devido ao tom avermelhado de suas edificações. A maioria das construções foram feitas com arenito avermelhado e, muitas das que não foram, são pintadas em tons de vermelho.
No centro da cidade as ruas são cercadas por pórticos, onde estão as calçadas. A idéia é excelente, facilita o conforto dos pedestres em dias de muito sol ou chuva. São 38 quilômetros de calçadas cobertas, ou galerias, no centro histórico da cidade.
O destaque da cidade é a Piazza Maggiore, onde está a Fontana de Nettuno, símbolo de Bolonha e os imponentes palácios em sua volta.
Na praça também esta a Basílica de San Petrónio, muito bonita por dentro, mas os seguranças vigiam o tempo todo impedindo qualquer fotografia.
A Basílica foi iniciada em 1390 e edificada por séculos, sua fachada ainda não foi concluída. Por duas vezes a Basílica sofreu atentados terroristas, praticados pelos muçulmanos radicais, que alegam que um dos afrescos no interior da Basílica, que dizem ser uma pintura que retrata Maomé no inferno, é um insulto para o Islão. Isto explica a forte vigilância no interior da Basílica.
Passamos pelo quadrilátero, uma região de ruas estreitas onde ficam diversas lojas de artesanatos, comidas e bebidas. É como se fosse um mercado municipal a céu aberto.
Paramos para o almoço, aquele já descrito acima, e chegamos em outra praça onde ficam as duas torres, outro símbolo de Bolonha. Uma das torres, ainda ereta com 97 metros de altura e outra inclinada com 47 metros de altura, diminuída para não cair de vez. As torres são do período medieval, eram mais de 180 e hoje restam apenas 20 na cidade.
As torres eram erguidas pelas famílias mais abastadas, acredito que por puro exibicionismo. Depois elas foram usadas como frentes de observação de ataques inimigos, a maioria delas foram derrubadas durante as guerras. Hoje, as poucas que restam, viraram pontos de visitas dos turistas.
Não visitamos mais nada de específico na cidade, que existe desde o ano 510 a.C.. Alem das poucas atrações, estava muito frio e garoando.
Deixamos a cidade vermelha por que ainda queríamos chegar em Modena, outra cidade vermelha, para visitar o museu do vermelho mais famoso, antes que fechasse.
Viajamos 40 km com muita chuva e estradas estreitas e muito movimentadas. Contando com o costumeiro desrespeito ao trânsito dos italianos, podemos dizer que foi uma viagem muito perigosa.
Modena é a capital dos motores, onde estão as fábricas dos carros esportivos mais prestigiados como Lamborghini, Masserati e Ferrari.
Chegamos e fomos os últimos a entrar no museu dedicado a Enzo Ferrari, que funciona na casa onde ele nasceu e onde ficava a oficina de seu pai. Tem uma bela coleção de objetos pessoais e de carros que pertenceram ao criador da marca de carros que apaixona pessoas do mundo todo.
Quando entramos, começou um filme envolvendo todo o salão, com projeções nas paredes, no teto e no piso. Emociona muito ouvir o ronco dos motores, a voz de Pavarotti, que nasceu nesta cidade, e o hino da Itália em som de alta qualidade.
A Ferrari começou com a paixão de Enzo Ferrari, grande empreendedor, criativo e amante de carros. Foi rejeitado pela Fiat como mecânico e, mais tarde conseguiu emprego como piloto de testes na Alfa Romeo.
Com muita dedicação, criou sua própria escuderia, já com a intenção de competir com a Alfa Romeo e a Masseratti, as duas melhores da região, que tempos depois, acabou por ser o proprietário.
Enzo foi um vitorioso nas pistas, conquistando 19 vitórias em Le Mans e 9 títulos na Fórmula 1. Depois que seu filho morreu, ainda jovem, Enzo abandonou as pistas e passou a dedicar-se na indústria de motores de alta velocidade. A sua marca venceu a Ford, que tentou comprá-la e, como não conseguiu, criou o GT40, que conseguiu acabar com o domínio da Ferrari nas pistas por alguns anos.
Enzo nunca desistia. Fez parceria com a Fiat e, com novos investimentos, criou novos motores e voltou ao lugar mais alto dos pódios. Ainda hoje seus motores frequentam o podium com muita freqüência.
Sua marca e seus cobiçados veículos encantam amantes do automobilismo em todo mundo. Só de ver uma Ferrari passar, muitos param e ficam encantados com sua beleza e, principalmente, com o ronco de seus motores.
Por muitos anos, a fabrica não colocava sistema de som nos veículos para que o ronco dos motores fossem apreciados pelos ocupantes com exclusividade.
Enzo Ferrari recebeu o título de Comendador do Governo italiano pelos seus feitos e morreu com 90 anos na cidade de Maranello, onde hoje fica a fábrica principal da mais famosa escuderia de todos os tempos, impulsionada pelos melhores motores.
Na saída, passagem obrigatória pela loja da marca do vermelho mais cobiçado no automobilismo, para comprar uma lembrança para um cara que gostamos muito e está no ramo da velocidade. É o nosso piloto brasileiro Johnny Herbert, que tem nome de piloto, velocidade nas veias, que já está familiarizado com o melhor lugar do podium e até com a tietagem.
Já era noite e pouco deu para conhecer da cidade de Modena. Foi mais chuva, asfalto ruim e pista estreita até chegarmos ao aconchego do nosso lar em Verona, à salvos e felizes por mais um dia de passeios e novas emoções.
Dia seguinte, com muito sol, arrumamos as malas para deixar Verona e partimos para conhecer o Lago di Garda, o maior da Itália e um dos mais belos lagos do mundo.
Desde a época dos romanos, o lago é destino de famílias ricas para férias de verão, mas existem ruínas que remontam de anos a.C..
As águas ricas em minerais brotam a uma temperatura elevada e são usadas para tratamento de saúde. Em alguns pontos, sua profundidade chega a 350 metros. Para dar uma volta completa no lago, são aproximadamente 160 quilômetros.
Nas suas margens, muitos esportistas se deliciam com esportes aquáticos no lado sul e com trilhas e escaladas no lado norte, próximo das montanhas geladas, início dos Alpes.
Existem muitas belezas naturais em sua volta e belas aldeias. A região é grande produtora de uvas, oliveiras e limões, cada tipo de cultivo tem seus respectivos museus nas proximidades do lago.
As margens do lago já foi palco de épicas batalhas. A principal delas foi a Batalha de Solferino, decisiva para a unificação da Itália. Esta sangrenta batalha, que deixou 40 mil mortos e feridos, deu início a uma motivação de voluntários para prestar ajuda humanitária às vítimas da guerra, sem descriminação, liderados pelo empresário francês, Jean Henri Dunat, que depois escreveu um livro sobre a tragédia.
Jean Henri mandou cópia de seu livro para políticos e militares em toda a Europa e, acabou inspirando a Convenção de Genebra, que definiu as formas de proteção de civis durante as guerras e a criação da Cruz Vermelha Internacional.
Das guerras, hoje só restam histórias e o lago agora é palco de incontáveis belezas.
Diante de tanta história em torno deste lago, nós, simples mortais viajantes em férias, nos limitamos a apreciar e continuar “dando milho aos pombos”, como aqueles que fazem a guerra deveriam também fazer.