Após 5 dias observando a folia do pré carnaval mais famoso do Brasil, o PréCaju, que acontece todos os anos em Aracaju, Sergipe, seguimos viagem.
Carnaval é festa que contagia a todos nós, sucetíveis de abusos, quando a comida e a bebida são boas e com fartura. Churrasco com carnes bem assadas, maionese, salada, feijão tropeiro, bolo, pudim e cerveja, provavelmente, foi a causa dos efeitos do dia seguinte.
Antes do pior acontecer, paramos para um banho com os Tambaquis numa enorme lagoa. Estacionamos em um restaurante e fomos tomar banho com os peixes.
Apesar de parecer carnudo e apetitoso, ninguém come Tambaqui por aqui. Quando eu brinquei com o rapaz de pegarmos um e fritar, ele me disse que “uma atriz famosa morreu depois que comeu Tambaqui”. Assim se propaga uma lenda, provavelmente com objetivo de inibir os moradores de comer os peixes e preservá-los para o turismo. Para muitos na região, se comer o peixe pode morrer ou a polícia prende. Não tem saída, ou vai preso ou morre. Portanto, não comam Tambaqui, pelo menos por aqui, ao sul de Aracaju.
Seguindo viagem entramos na Bahia e passamos por muitas cidades, uma a cada 20 ou 50 quilômetros, com muitas opções para comprar frutas, verduras, comidas, artesanatos, lanchonetes e restaurantes. Foi oque amenizou um pouco a viagem.
No meio do dia eu comecei a sentir fortes dores no estômago e um mal estar aumentando. Segui dirigindo com chuva na parte da manhã e muito sol na parte da tarde, parando a cada hora para ir ao banheiro. No meio da tarde encontrarmos um posto de combustível, onde puderíamos dormir com segurança. Logo Ade começou a sentir os mesmos sintomas que eu. Pronto! Provável intoxicação alimentar dupla. Ficamos tristes, tentando encontrar uma solução em meio a dores, calafrios e longe de socorro médico. Tomamos água de coco, Gatoreide e muita água para amenizar a desidratação.
Noite mal dormida e na manhã seguinte pegamos a estrada na fé de que logo tudo iria melhorar. Paramos numa lanchonete e o homem logo se ofereceu para ajudar quando disse a ele que eu e Ade estávamos indispostos com o estômago. Ele foi no fundo do restaurante e, de uma roça bem cuidada, retirou alguns galhos, lavou, bateu no liquidificador, coou e serviu dois copos, um meu e um da Ade. Era boldo.
Ele me disse que o pai dele, quando um filho ficava doente, fazia o remédio com plantas. O pai fecundou 26 filhos com duas mulheres, 10 com uma e 16 com outra, todos vivos e lembrou que ele ainda ficou alguns anos morando sozinho em São Paulo. Nem sabe se tem outros por lá.
Depois de dois dias de viagem sofrida, paramos em Itacaré para comprar peixes frescos, direto com o pescador. Detalhe. Ficamos esperando por mais de meia hora, todos estavam no horário de almoço e só começam a vender a partir das 14 horas, no período da tarde. Apesar de estarem na peixaria, com as portas abertas e trabalhando, só vendem a partir das 14 horas, por conta de um trato coletivo que é respeitado por todas as peixarias. Cliente esperando sem entender.
No tempo que a qualidade do comércio considerava o cliente como “rei”, tudo era feito para encantar o comprador, aquele que escoa a produção. Hoje, a regra é aliciar, atrair, convercer ou cooptar. Esta diminuindo a importância do comprador de ser bem atendido, comprar qualidade e pagar o preço justo. Tempo bom! Hoje me parece que o comercio esta lá, no horário e nas condições dele e você compra se quiser. Tipo, se você não comprar outro compra.
Eu ainda acho que o cliente é o rei e deve ser encantado pelo comércio. Esperamos o horário para abrir as portas, que já estavam abertas, para comprar e seguir viagem.
Fomos para o camping Paraíso na Praia do Sargi que, apesar de pouco movimentada, foi destaque ao ser eleita uma das 10 melhores praias da América Latina, por uma comunidade de especialistas em gestão e certificação de praias em todo mundo. Merece o prêmio.
A praia tem 4,5 km de extensão, ótima para banhos e caminhadas. Tem muitos coqueiros, uma grande mata protegida e pertence ao município de Uruçuca, na Costa do Cacau Baiana.
O restaurante do camping é destaque na região. Todos querem provar suas deliciosas moquecas, com peixes frescos.
A Costa do Cacau na Bahia é privilegiada de belezas estonteantes, especialmente a beira mar. Nas areias da Praia do Sargi, formam 4 caminhos com pisos diferentes. Uma de areia fofa, branca e brilha com o sol. Outra macia que é como pisar num colchonete de borracha. Outra mais dura para caminhar de tênis ou andar de bicicleta e a última pelas águas rasas do oceano.
Na Praia tem várias casas, mas todas escondidas por causa dos coqueiros, pequenos e grandes, causando uma leve impressão de estarmos numa praia deserta, ou no mínimo, sossegada.
O Camping e Restaurante Paraíso é um dos melhores que já estivemos. É a segunda vez que acampamos aqui e certamente iremos voltar mais vezes, não somente pela beleza da praia mas também pela estrutura do nosso quintal.
Ficar com o “pé na areia”, como chamamos os campings a beira mar, facilita o acesso a praia a qualquer hora do dia. No meio do dia para tomar banho de mar, a noite para tirar fotos, ao entardecer para ver o pôr do sol e de madrugada para ver o sol nascer. É só querer.
Camping é lugar de novos amigos. Aqui convivemos com dois casais de São Paulo. Em quase todas as refeições, “juntamos panela”, como chamamos almoçar juntos. Combinamos um cardápio e cada um traz um pouco do que tem, sempre é muito agradável. A conversa nunca pára quando é boa.
O cara que entrega gás disse que sabia onde tinha o mel do cacau e poderia trazer no sábado e aceitei na hora. No dia combinado ele chegou com duas garrafas do mais puro mel de cacau, conhecido na antiguidade como a bebida dos deuses. Dividimos o precioso líquido entre nós e seguimos cada um por um rumo diferente, que poderá se cruzar em outro lindo lugar. Quem procura acha.
Passamos por Ilhéus e andamos vagarosamente pelas ruas imortalizadas por Jorge Amado, o gigante que tem pelo menos duas estátuas de bronze na cidade que ele nasceu e viveu as aventuras reais e fictícias, contadas em suas histórias imortais.
Entramos no Bataclan, um cassino que também era casa de prostituição, que funcionou de 1.920 a 1.950. Ali viveu Maria Machadão, a cafetina do local e Ambrósia Buzú que era a quenga mais procurada, a que mais servia os coronéis.
Para frequentar o prostíbulo, os coronéis tinham um acordo com o padre da igreja atrás do Bataclan. O padre pedia para tocar o sino no início da missa é às quengas se preparavam no prédio vizinho. Os coronéis diziam para as esposas que ficariam no Bar Vesúvio, ao lado da igreja, enquanto elas rezavam. Só que, do Bar Vesúvio tinha uma passagem secreta para o prostíbulo. O beco ainda hoje é lembrado como o “túnel das putas”, por onde passavam os coronéis para se divertir.
Conta a história que quando chegavam quengas novas, a missa chegava a durar até 4 horas. Pouco antes do padre terminar a missa o sino tocava novamente e os coronéis voltavam para o Bar Vesúvio e aguardavam suas esposas. Coisas da realidade brasileira ou seria obra de ficção de Jorge Amado?
Este foi o quarto de Maria Machadão, onde somente os coronéis do cacau mais poderosos tinham acesso para se divertir com Machadão.
Ainda hoje o prédio construído com paredes grossas e óleo de baleia, que resistiu a muitos interpéries, está em pleno funcionamento, não mais como um cassino ou prostíbulo, mas como um bar e restaurante e uma espécie de museu onde se paga 12 reais para visitar e ouvir esta história contada por um guia vestido de coronel.
Rumo a Porto Seguro, outra praia que já conhecemos e sempre vai fazer parte do nosso roteiro pela Bahia.